No fim de 2018 tramitavam na Justiça brasileira 78,7 milhões de ações. Na Justiça Estadual, leva-se em média seis anos e dois meses para um caso chegar ao fim. Na Justiça Federal é ainda maior: mais de oito anos. Ao lado do imobiliário, o mercado judiciário é outro de baixa liquidez. E se tem algo que dá dinheiro (ou seria custa dinheiro?) é morosidade e ineficiência. Foi nisso que o advogado Rodrigo Valverde pensou ao criar a Pro Solutti, que gerenciar ativos judiciais.
A ideia é algo novo no mercado jurídico brasileiro de pessoas físicas, mas já visto em casos de arbitragens e mediações de empresas. A ideia é simples: identificar áreas que tenham processos relativamente conhecidos e fáceis, como dentro das searas trabalhistas e cíveis; “comprar” o caso, pagando o autor da ação com deságio em relação ao valor do processo; e tocar o processo, tentando identificar onde dá para subir o valor. Se ganhar, bem. Se não sair perdedor, o risco fica com a empresa e não com o autor.
“Somos uma gestora de passivos judiciais que usa tecnologia para gerenciar processos. Queremos trazer liquidez para o mercado jurídico, no qual uma pessoa pode esperar mais de 10 anos para uma decisão e mais um tempo para ver a cor do dinheiro”, diz Valverde, que deixou o escritório do qual era sócio, RV Law, no fim do ano passado para se dedicar a nova empresa.
Desde sua fundação, em outubro de 2018, a Pro Solutti já soma 45 casos no portfólio, sendo 30 trabalhistas e 15 cíveis, cujo valor das causas somam R$ 80 milhões. A ideia começou quando o próprio Valverde foi procurado para assumir um caso em que o processo já corria há anos e o autor precisava do dinheiro. Aos poucos foi entendendo que isso poderia virar um negócio. Começou com dinheiro próprio e agora já abriu para outros investidores interessados.
“Quero ser uma alternativa de investimento para quem não está conformado com o patamar de juros hoje”, diz Valverde.
Investidor
A empresa tem duas opções para quem quer entrar no negócio. Na primeira, a Pro Solutti compra o processo judicial e depois oferece uma espécie de cotas dele para os investidores. Exemplo: um processo de R$ 10 milhões, investidores são convidados para entrar com cotas de R$ 250 mil. A remuneração é de 18% ao ano mais um percentual a combinar sobre o êxito a ser pago no fim da tramitação, isso se a empresa for bem sucedida e ganhar a ação.
Se perder, o investidor recebe apenas o investimento inicial (ou principal). Como há um variável sobre o êxito, Valverde conta que já teve investidor que recebeu mais de 25% de retorno ao ano e até 200% sob o valor investido. A desvantagem é que o investidor tem que esperar o fim da ação e ainda tem o risco de sair perdedor.
O segundo modelo de negócio é um mandato flexível, em que o investidor coloca o dinheiro e a Pro Solutti “aplica” na compra e venda de processos com prazo de duração mais rápido, como os de juizados especiais cíveis. “Neste caso, não compramos um processo específico, mas um conjunto de processos e rodamos a carteira, às vezes, mais de uma vez por ano. Quanto mais eficiente eu for, mais dinheiro o investidor recebe”, pondera Valverde.
Áreas
A intenção é se manter nessas áreas em que há processos comuns, como reclamações de cobranças indevidas feitas por bancos e empresas de telefonia, ou queixas trabalhistas em casos de não pagamento de horas extras ou demissões por justa causa.
A recorrência facilita na hora de tecnologias (como inteligência artificial) e jurimetria (estatística aplicada ao direito) para gerenciar os processos. A startup usa tecnologia também para calcular custos e retornos dos processos. A conta, claro, precisa fechar.
Mas não é qualquer processo. Nos cíveis, a Pro Solutti busca ações que valem entre R$ 5 milhões a R$ 100 milhões. Mas também pega alguns casos menores de processos de juizados especiais cíveis (processos de consumidores), de no máximo R$ 40 mil. Desse tipo, já cuidou de mais de 100 e já recebeu 30%. Na área trabalhista, prefere casos entre R$ 200 mil a R$ 2 milhões.
O pagamento ao autor da ação é feito com um desconto calculado com base nos custos médios com ações do tipo. Valverde explica que são gastos, em média, 25% do valor da ação com custos operacionais e o trabalho dos advogados.
“Também queremos assumir processos de empresas que não têm o jurídico como seu negócio principal. Terceirizando essa gestão, elas liberam espaço e inteligência para fazer o que fazem de melhor”, diz Valverde.
Por Naiara Bertão, Valor Investe — São Paulo